Desde que a covid-19 foi declarada pandemia pela OMS (Organização Mundial da Saúde), há pouco mais de um ano, o Brasil já soma quase 440 mil mortes. O pouco caso do governo federal com a pandemia faz os números nacionais se manterem nas alturas. A CPI da covid tenta, nesse momento, apurar omissões e irregularidades envolvendo a gestão da crise sanitária. Se vai, de fato, responsabilizar os agentes públicos que conduziram o país a essa situação e, principalmente, puni-los, ainda não dá para saber.
Há muitas indagações e afirmações, nem sempre verdadeiras, sobre a pandemia. Uma das falas recorrentes é que o vírus é democrático e atinge a todos, independentemente de classe social, raça/cor. Os dados de contaminação, óbito e acesso a tratamento, no entanto, mostram que isso não é verdade. O vírus atinge mais aqueles que precisam se expor, como profissionais de atividades essenciais, de todos os níveis, e os mais pobres, que se arriscam diariamente em busca de renda ou vivem em condições precárias, dividindo com familiares espaços restritos e apertados, em áreas de grande adensamento populacional, que nem mesmo contam com saneamento. Segundo a Fiocruz, nos primeiros quatro meses de pandemia, ainda em 2020, obesos, negros, nortistas e nordestinos compunham os grupos que mais se contaminaram e perderam a vida. Outro levantamento mostra que são os homens que morrem mais de covid-19.
Na semana passada, um estudo realizado pelo DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) chamou a atenção para o aumento no número de desligamentos por morte no emprego com carteira assinada entre os primeiros trimestres de 2020 e 2021. Utilizando dados do novo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério da Economia, o DIEESE mostrou que os desligamentos por morte no Brasil cresceram 71,6% nesse período, passando de 13,2 mil para 22,6 mil. Apesar de os dados analisados não informarem a causa das mortes dos trabalhadores, o aumento demonstra o impacto da pandemia no mercado de trabalho formal.
De acordo com o documento, os estados do Norte são os que tiveram os maiores aumentos percentuais de desligamentos por morte: no Amazonas, a ampliação foi de 437,7% – foram 114, no primeiro trimestre de 2020, e 613, no mesmo período de 2021. Em seguida, aparecem Roraima, com expansão de 177,8%; Rondônia, crescimento de 168,6% e; Acre, aumento de 109,5%.
No estado de São Paulo, o mais populoso do país, os desligamentos por morte cresceram 76,4%, passando de 4,5 mil para 7,9 mil.
Nas atividades de atenção à saúde humana, categoria que inclui os trabalhadores nos hospitais gerais ou especializados, que permitem internações de longa ou curta duração, hospitais psiquiátricos, centros de medicina preventiva, consultórios médicos e dentários, clínicas médicas e outras atividades ambulatoriais da saúde, o aumento foi de 75,9%, saindo de 498 para 876. Já os percentuais para enfermeiros e médicos mais que dobraram: 116,0% e 204,0%, respectivamente.
Quando consideradas todas as atividades econômicas, as que apresentaram os aumentos mais expressivos de desligamentos por morte foram: eletricidade e gás, 142,1%, informação e comunicação, 124,2%, educação, 106,7%, transporte, armazenagem e correio, 95,2%.
Como já dito, o DIEESE analisou dados do mercado formal. Entre os trabalhadores informais, a situação é mais complexa e difícil de ser examinada, mas sabe-se que é ainda mais grave, pois o trabalho é, no geral, exercido em condições de total vulnerabilidade.
Por serem essenciais, todas essas atividades continuaram em andamento durante a pandemia, realizadas por trabalhadores que precisaram se arriscar diariamente para cuidar dos doentes, manter vivo o comércio eletrônico, levar pessoas de um canto a outro, educar, entre outras tarefas. Heróis anônimos que se aventuram para manter a sociedade funcionando durante a maior crise sanitária e hospitalar já vivida no pais.
Fausto Augusto Junior, Diretor Técnico do DIEESE e Patrícia Lino Costas, Supervisora de Produção Técnica do DIEESE