A malária é uma doença causada por quatro diferentes tipos de protozoários do gênero plasmodium. Deles, três estão ativos no Brasil (o plasmodium vivax, o plasmodium falciparum e o plasmódio malarin) e podem transmitir a doença tanto para as pessoas que vivem aqui como para quem está visitando o país.
A transmissão pode ocorrer de duas formas: por meio da picada de um mosquito que esteja infectado com o protozoário ou pelo uso incorreto e compartilhamento de agulhas e instrumentos cortantes.
O Brasil de Fato conversou com a Dra. Tânia Chaves, médica infectologista e pesquisadora do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas. Ela também é docente da faculdade de medicina da Universidade Federal do Pará (UFPA), consultora e membro do Comitê de Medicina Tropical da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).
Segundo ela, ocorre uma fragilidade das medidas de vigilância e assistência para as endemias já existentes. “No caso da malária, o Brasil, contribui com parcela importante na América Latina com relação ao número de casos e nós tivemos essa queda e retornamos para um aumento importante, muito em função da fragilidade das medidas de ações de controle em função da emergência de novos agentes”, diz ela.
Confira abaixo a entrevista.
Brasil de Fato: Os casos de malária no Brasil tiveram quase uma década de queda no número de registros, mas os dados voltaram a crescer. A que se deve esse fenômeno?
Dra.Tânia Chaves: Uma das razões para o aumento do número de casos de malária no nosso território sem dúvida, se dá em razão das emergências em saúde pública, que temos enfrentado desde 2014.
O que acontece quando as emergências, a introdução de novos patógenos, como, por exemplo, o Zika Vírus, que trouxe o apelo da microcefalia, a chikungunya, que trouxe também a incapacidade das pessoas de retornar às suas atividades.
Nesses casos, os serviços de vigilância e assistência em saúde pública se voltam para dar uma resposta a esses novos patógenos, que são observáveis não somente entre nós, mais de uma maneira geral, no mundo inteiro.
Fato é que ocorre uma fragilidade das medidas de vigilância e de assistência para as endemias já existentes.
No caso da malária, ela é uma doença endêmica na região amazônica, o Brasil, contribui com parcela importante na América Latina com relação ao número de casos e, realmente, nós tivemos essa queda e retornamos para um aumento importante, muito em função da fragilidade das medidas de ações de controle em função da emergência de novos agentes, que também nós tivemos que nos organizar. Isso foi observado no mundo inteiro.
Além dos impasses com relação às políticas públicas de saúde, é possível relacionar esse aumento com o desmatamento?
São inúmeros fatores que contribuem para o aumento do número de casos de uma endemia da magnitude da malária na nossa região. Então, a fragilidade no serviço de vigilância epidemiológica, o retardo no diagnóstico e tratamento, o desmatamento, o fluxo de pessoas – e quando falo do fluxo de pessoas, me refiro aos viajantes, especialmente, aqueles que nunca estiveram na região amazônica e que procuram a região a fim de obter melhorias de vidas e oportunidades de novas frentes de trabalho.
Então, com certeza assim, contribui pelo desmatamento, pela alteração do bioma, alteração climática. Isso favorece com que os vetores que são os mosquitos anófeles encontrem condições para que eles se reproduzam.
Assim, sem dúvida nenhuma, existem estas características do bioma natural e a interferência do homem que contribuem para isso, mas vale dizer que não existe um único fator responsável por esse aumento do número de casos.
A malária é uma doença com maior incidência na América Latina, correto? Nós podemos considerar que ela é uma ameaça nesse momento?
A malária é uma das principais parasitoses que afeta o mundo. Cerca de 95 países estão em ameaça. Vale dizer que ela é uma doença endêmica, logo, por mais que se controle a doença, ela sempre ocorrerá nessas regiões.
Logo, sem dúvida nenhuma, um dos maiores desafios, principalmente, nas áreas remotas é termos um diagnóstico rápido, fácil, de acurácia elevada, que seja fidedigno o mais próximo possível e o tratamento seja imediato.
Alerto também, que ao se tomar uma medicação para febre ou iniciar o tratamento da malária nas primeiras vinte e quatro horas, o paciente tem uma melhora importante. No entanto, com essa melhora, muitas pessoas abandonam o tratamento.
Logo, esse abandono do tratamento e essa conscientização das pessoas que vivem na área endêmica sobre a continuação do tratamento da malária, também é um dos desafios para nós que trabalhamos em saúde pública.
Quais são os sintomas e as formas de prevenção da malária?
A malária é uma doença infecciosa, aguda e febril e ela está muito relacionada aos deslocamentos dos indivíduos para as áreas com transmissão da doença.
Clinicamente, ela vai se caracterizar por febre e não é uma febrícula, é uma febre alta, com dor de cabeça e calafrios. Esses são os três principais sintomas. Além desses, a pessoa pode apresentar também a prostração. A pessoa perde o apetite, pode ter dor abdominal, diarreia, alteração e dor nas articulações.
No entanto, o quadro mais importante é a dor de cabeça, a febre e os tremores que nós chamamos de calafrios.
Quanto às formas de prevenção, a primeira forma de se prevenir é conhecer a doença, os sintomas dela e onde ela ocorre. A isso chamamos: alerta sobre o risco.
A outra medida que é adotada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é o passo D, é evitar as picadas de inseto usando um mosquiteiro, que tem sido distribuído na região amazônica.
O mosquiteiro tem que ser usado diuturnamente, principalmente, para as crianças abaixo de cinco anos e as mulheres grávidas.
Chamando a atenção, que quando essa população de grávidas e crianças abaixo de cinco anos são acometidas em maior número em uma determinada região, significa dizer que a malária está fora de controle.
Logo, para se prevenir, é preciso saber dos riscos, evitar picadas de insetos usando mosquiteiro, telando portas e janelas, usando repelente e evitando se expor no final do dia e à noite, porque é o momento em que esses os mosquitos anófeles têm uma maior densidade.
Em saúde pública é basicamente desta forma que nós prevenimos a malária.
E quanto ao diagnóstico? Como ele é feito?
O diagnóstico da malária é rápido e fácil, mas ele precisa ser realizado em um posto de saúde ou pelos agentes comunitários de saúde furando o dedo.
Há muitas décadas, uma figura da saúde pública chamado “fura dedo” passava fazendo uma vigilância para saber quem estava com malária ou mesmo filária.
O exame é feito por meio da punção da polpa digital, depois coloca uma gota de sangue em uma lâmina.
Depois, a lâmina será preparada por esse agente comunitário de saúde, que está preparado ou ainda, os que estiverem preparados para dar o diagnóstico, o coram, com os corantes adequados e esse resultado fica pronto entre 35 min a 50 min.
Existem ainda outros testes que podem ser utilizados para o diagnóstico da malária, que chamamos de testes rápidos. Eles são muito utilizados nas áreas remotas em que não se tem acesso ao microscópio, porque para a modalidade da punção da polpa digital, cujo exame se chama gota espessa – é preciso ter acesso à luz elétrica para podermos identificar o agente causador da malária.
Como é feito o tratamento? E a malária pode vir a ser uma doença letal?
Hoje a malária é causada na nossa região por três importantes parasitas, que são os plasmódios, o plasmodium vivax, o plasmodium falciparum e o plasmódio malarin.
Todos os três podem evoluir para formas graves, inclusive, levando a óbito. Isso acontece quando há retardo no diagnóstico e eu reforço mais uma vez: no caso de as pessoas apresentarem febre, dor de cabeça e calafrios nas áreas da região amazônica ou que visitaram a região amazônica nesse momento de final de ano, em que as viagens não estão recomendadas, mas que mesmo assim viajaram, a recomendação é que se no seu retorno, entre 7 a 14 dias, você apresentar febre, você tem que buscar atendimento médico para fazer o diagnóstico por meio da gota espessa.
O tratamento da malária varia de três a sete dias, a depender da espécie que causou ou está causando a malária.
Existe um tratamento específico para a malária ivax, malária falciparum e o malária malarin, por isso, é importante que a pessoa esteja em um local em que o serviço tenha experiência e que evoque esse diagnóstico para iniciar imediatamente o tratamento da doença.
Fonte: Brasil de Fato