Há 1 impasse objetivo que envolve as chamadas esquerda e centro-esquerda, que vai precisar ser equacionado olhando para o futuro e pensando generosamente no povo brasileiro e no Brasil. Esse impasse evidenciou-se mais ainda nestas eleições municipais. Esses 2 matizes políticos separados (PT e PDT) não ganham. Pior para esses. Pior para o Brasil e o povo brasileiro.
Mas, antes de entrar nesse contencioso é preciso fazer algumas brevíssimas considerações que precisam ser debatidas com serenidade, respeito e frieza, porque política deve ser feita de forma impessoal, inclusive superando as cruezas da vida e as soberbas d’alma. Sigamos.
A rejeição ao PT, que começou nas manifestações de junho/julho de 2013, avançou em 2016, consolidou-se em 2018, ao ponto de ter sido a principal variável que inviabilizou o candidato do partido, Fernando Haddad, mostrou-se resiliente e sem sinais de arrefecimento nestas eleições.
É verdade que todas as forças de esquerda e centro-esquerda perderam neste pleito. Uns mais, outros menos, mas, perderam. Os números são evidentes e ‘falam’ por si. Vamos expor alguns apenas para efeito comparativo. Em particular do PT e PDT.
PT e PDT perderam
Dos 174 prefeitos eleitos 20 anos atrás, o PT aumentou para 411 prefeituras em 2004. Em 2008, saltou para 549 municípios. Em 2012, estendeu seu poder para 630 prefeituras. Caiu para 254 prefeitos nas eleições de 2016 (veja quadro completo com desempenho de todos os partidos no 1º turno). E agora tem 179. Mesmo que tenha êxito total (impossível) onde ainda vai disputar o 2º turno não vai ultrapassar os números de 2016.
O PDT está à frente do PT, mas também perdeu. Vamos aos números. Em 2004, a legenda brizolista elegeu 306 prefeitos. Subiu, em 2008, para 351. E caiu novamente em 2012, quando alcançou 304 administrações. Subiu em 2016, com 331 eleitos e caiu em 2020, fazendo 311 municípios.
O PDT foi o partido do campo progressista — esquerda e centro-esquerda —, cujo desempenho foi o mais exitoso.
Separados, o PDT (311) está na 6ª posição e o PT (179), na 11ª. Juntos, se se entendessem desde já, como se estivessem coligados em nível nacional, subiriam para a 5º posição (490) no ranking dos partidos que elegeram mais prefeitos no 1º turno. Ficariam atrás do MDB (774), PP (682), PSD (650) e PSDB (512). E ficaram à frente do DEM (459) e do PL (345).
O PT, numericamente teve mais votos que o PDT. O 1º recebeu 6.972.246 e o 2º, 5.318.867. Em população dos municípios que cada partido vai governar no Brasil (% do total do estado, no 1º turno), o PDT (3,32%) está na frente do PT (1,87%).
Rejeição, a variável
Votando à rejeição ao PT, essa mantém-se firme, forte e resiliente e, tudo indica, não arrefecerá em 2022. A velha mídia trabalha isso, com competência, e o partido de Lula não está conseguindo superar esse problema. Dito isto, qualquer candidato do PT, salvo melhor juízo, inclusive Lula, se puder ser candidato, não terá chance de ganhar a batalha presidencial, mesmo sob aliança. Seja alicerçado por frente de esquerda ou ampla. O PT está agendado, como se diz no jornalismo.
As chamadas forças de esquerda que elegeram prefeitos e vereadores — PT, PCdoB e PSol — foram fragorosamente derrotadas neste pleito. PCB, PCO e PSTU não elegeram ninguém. Esse resultado joga por terra qualquer tentativa de essa configuração partidária restrita vir a ter êxito em 2022.
Assim, diante desse cenário que se anuncia catastrófico no futuro, o mais sensato, lúcido, e diria até inteligente, será construir uma aliança ampla, com PDT e PT se sentando à mesa desde já como forças políticas maduras e bastante experimentadas, que estão pensando no País e no povo brasileiro, para delinear o que pode ser melhor diante do caos que é o governo do presidente Bolsonaro.
Volto novamente à variável ‘rejeição’ para propor uma reflexão geral. O PT, com o estigma a que está submetido, caso não esse arrefeça e caia, não ganha. Se estiver na ‘cabeça’ de qualquer composição vai ser rejeitado. Pode descer Jesus Cristo, se botar a estrelinha do PT no peito, perde!
PDT e Ciro
Depois de Lula, Ciro Gomes é o quadro da esquerda brasileira mais conhecido. É o quadro do campo da esquerda mais preparado e experiente. Mas, sozinho ou com os partidos que anunciam aliança — PSB, PV e Rede — não tem a menor chance. Não estou dizendo nenhuma novidade. O pleito de 2018 já nos antecipou esse quadro e agora, em 2020, isto ficou mais explícito.
Diante deste cenário, se estiver correta esta leitura, para disputar com chances de vitória as eleições presidenciais de 2022, o campo progressista — esquerda, centro-esquerda e centro —, terá de formar uma frente, ampla!
O resto são idiossincrasias que terão de ser superadas com tranquilidade, sabedoria e habilidade. Refiro-me às arengas entre Ciro/PDT e Lula/PT, seus microentornos e a militância de ambas as forças políticas que se digladiam dia e noite nas redes sociais. Ou todos darão 1 passo atrás para depois dar 2 à frente, ou a derrota se anuncia bruta.
Nessa equação não se pode esquecer o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), cuja gestão é bem avaliada, e Guilherme Boulos (PSol), cujo cacife na bolsa de apostas subiu muito.
Política é ciência inexata
Tudo isso pode não acontecer, pois política, embora seja ciência, não é exata. Muitos fatores internos e externos interferirão nesse processo e daqui a 2 anos tudo pode estar melhor ou pior. Pessoalmente, não acredito que o País estará melhor sob Bolsonaro. Assim, vai ser preciso saber trabalhar todos os elementos que estão sobre o tabuleiro, com calma, inteligência, frieza e visão no futuro.
Por fim, mas não menos importante, se essa equação política não ocorrer — a aliança ampla —, ninguém vai morrer ou se acabar. Aqueles que pensam ou desejam que o PT se imploda não terão sucesso. Bem ou mal, o partido de Lula vai seguir sua trajetória. E o PDT também.
Mas, em grande medida, os eleitores já anteciparam neste pleito que finda no dia 29 de novembro, que nem o PT/Lula, nem o PDT/Ciro ganharão separados em 2022. Nesse cenário, a direita, chamada eufemisticamente pela velha mídia de ‘centrão’, poderá levar! Já deu o 1º passo, pois ganhou as eleições, cuja 1ª fase terminou no último domingo (15).
E assim, se isso acontecer, é como diz Ferreira Gullar: ‘Em casa que não tem pão todos brigam e ninguém tem razão’.
Marcos Verlaine é Jornalista, analista político e assessor parlamentar licenciado do Diap