PUBLICADO EM 01 de out de 2024
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Queimadas prejudicam trabalhadores na Califórnia

Até agora, em 2024, incêndios florestais queimaram mais de 800.000 acres em todo o estado da Califórnia (EUA) e destruíram milhares de estruturas e propriedades. As mudanças climáticas estão tornando os incêndios florestais mais graves, e a tendência deve continuar sem uma intervenção séria.

Incêndio Park que começou no Condado de Butte, CA em julho de 2024. Foto: FLICKR do Departamento de Silvicultura e Proteção contra Incêndios da Califórnia

Incêndio Park que começou no Condado de Butte, CA em julho de 2024. Foto: FLICKR do Departamento de Silvicultura e Proteção contra Incêndios da Califórnia

Por Ellen von zur Muehlen

Dados mostram que pessoas de baixa renda, comunidades marginalizadas e trabalhadores rurais enfrentam maiores riscos com os incêndios florestais e a poluição do ar associada a esses desastres.

O maior incêndio deste verão, o Park Fire, devastou quase 430.000 acres no norte da Califórnia no final de julho e início de agosto, tornando-se o quarto maior incêndio florestal da história da Califórnia. No sul do estado, o Borel Fire destruiu quase 60.000 acres no condado de Kern, em grande parte na Floresta Nacional de Sequoia.

Cientistas concordam que a temporada de incêndios florestais de verão na Califórnia está se tornando mais intensa ao longo do tempo, como resultado direto das mudanças climáticas causadas pelo homem. As mudanças climáticas criam verões mais quentes e secos, e, combinadas com o manejo florestal inadequado, resultam nas condições ideais para o surgimento e a propagação rápida dos incêndios. O ano de 2023 foi o mais quente já registrado, e 2024 está previsto para estabelecer um novo recorde.

Trabalhadores e idosos são os mais afetados pelos incêndios florestais

Pessoas da classe trabalhadora e idosos são os grupos mais afetados pelos incêndios florestais na Califórnia. Um estudo de 2021, publicado no International Journal of Environmental and Public Health, constatou que as comunidades da Califórnia em áreas frequentemente afetadas por incêndios são mais propensas a serem de baixa renda e a ter maiores proporções de residentes idosos e indígenas.

Essas comunidades, que já tendem a ter acesso limitado a serviços de saúde e outros serviços sociais, estão em maior risco de deslocamento e de efeitos adversos à saúde relacionados à fumaça e ao calor extremo.

Em julho, pesquisadores da Universidade da Califórnia, em Irvine, publicaram um artigo no Environmental Research Health que destaca ainda mais os encargos dos incêndios florestais sobre comunidades de baixa renda e minorias na Califórnia. O estudo documenta que as comunidades do sul da Califórnia enfrentam fumaça e incêndios florestais com mais frequência e intensidade do que no passado e que populações pobres e exploradas enfrentam mais dificuldades para responder e se proteger desses desafios.

Nas últimas duas décadas, a exposição a incêndios florestais mais que dobrou para a população dos EUA. Na Califórnia, a área queimada no verão aumentou cinco vezes de 1996-2021, em comparação ao período de 1971-1995. Além disso, a temporada de incêndios na Califórnia está começando mais cedo e terminando mais tarde do que nos anos anteriores, à medida que as condições se tornam cada vez mais quentes e secas.

A fumaça dos incêndios florestais é uma mistura de gases tóxicos e partículas finas que pode impactar profundamente a saúde física das pessoas. Pode causar dificuldade para respirar, irritação nos olhos, erupções cutâneas, dores de cabeça, inchaço na garganta e muito mais. Aqueles com condições preexistentes, como asma ou problemas cardíacos, são especialmente afetados, pois a fumaça dos incêndios pode causar crises e aumentar o risco de ataques cardíacos e derrames.

No curto prazo, a exposição à fumaça dos incêndios florestais aumenta as visitas aos prontos-socorros por problemas respiratórios. A inalação de fumaça também leva a efeitos devastadores de saúde a longo prazo.

Um estudo recente da UCLA mostra que a exposição crônica à fumaça de incêndios florestais leva ao desenvolvimento de doenças de longo prazo e relaciona mais de 50.000 mortes entre 2008-2018 à inalação de fumaça. Um estudo de pesquisadores da Stanford e da Komodo Health encontrou um enorme aumento na asma infantil relacionada à fumaça de incêndios florestais, particularmente entre crianças latinas.

Além das doenças cardiovasculares, novos estudos também mostram que a fumaça dos incêndios florestais expõe as pessoas a substâncias químicas cancerígenas e leva ao aumento das taxas de câncer de pulmão e tumores cerebrais.

A saúde mental das pessoas também está em risco. Incêndios florestais, ou mesmo a ameaça deles, causam enorme medo, estresse e ansiedade. A ameaça de que a casa, o sustento, a família e a comunidade possam ser destruídas ou prejudicadas causa sentimentos de medo e desesperança. As evacuações causam sofrimento extra quando as pessoas precisam abandonar animais de estimação e bens preciosos.

O estudo da UCI também identificou várias maneiras de preparar melhor as comunidades e os governos locais para incêndios florestais. Os residentes entrevistados no estudo expressaram a necessidade de mais recursos para ajudar a mitigar o risco de incêndio e ajudar os residentes forçados a evacuar, como, por exemplo, estocar centros comunitários com kits de emergência.

Da mesma forma, o estudo observou a falta de assistência pós-incêndio oferecida às comunidades desfavorecidas. Alguns dos residentes entrevistados pelos pesquisadores mencionaram não terem recebido informações sobre centros de evacuação, ou passos apropriados a serem tomados, ou contatos para ajuda.

Outro problema destacado no estudo foi a falta de comunicação eficaz das advertências oficiais para incêndios e zonas de evacuação. Em alguns casos, os avisos não chegaram a todos os residentes nas áreas afetadas, ou chegaram apenas por meio de comunicação boca a boca, e, em outros casos, populações de falantes monolíngues de espanhol receberam avisos e instruções de evacuação apenas em inglês.

Riscos Especiais

Trabalhadores rurais na Califórnia enfrentam níveis elevados de risco e impacto com os incêndios florestais que afetam o estado, em grande parte como resultado de políticas públicas. Um estudo recente de pesquisadores da UC Irvine e do NSF National Center for Atmospheric Research documenta que uma combinação de incêndios florestais crescentes e políticas anti-trabalhadores expõe os trabalhadores rurais a condições perigosas para sua saúde e segurança. Utilizando dados da temporada de incêndios de 2020 no condado de Sonoma, Califórnia, os pesquisadores mostraram que os trabalhadores rurais são expostos a níveis excessivos de poluição tóxica do ar devido à fumaça dos incêndios florestais.

Uma causa importante dessa exposição perigosa vem do Agricultural Pass Program. Adotado pelo condado de Sonoma em 2017, o programa permite que trabalhadores rurais continuem trabalhando em zonas de evacuação obrigatória, áreas onde as condições são consideradas perigosas para a população em geral.

O estudo examinou a aplicação do programa, constatando que o processo de concessão do passe era irregular, sem diretrizes claras sobre quais condições eram consideradas seguras para os trabalhadores rurais. Parte do problema descoberto pelos pesquisadores foi a falta de monitoramento adequado da qualidade do ar, pouca supervisão do programa e padrões de segurança baixos exigidos dos empregadores.

O propósito do Agricultural Pass Program, que governos locais em todo o estado podem adotar voluntariamente, é evitar perdas de desastres naturais na agricultura comercial, permitindo que os trabalhadores entrem em áreas restritas, como zonas de evacuação de incêndios florestais.

Projetado para proteger os lucros dos empregadores às custas da segurança dos trabalhadores, o programa depende dos empregadores para monitorar as condições de segurança e não contém diretrizes claras para o processo de aprovação. Os próprios trabalhadores agrícolas, que em grande parte provêm de grupos socialmente desfavorecidos, incluindo imigrantes indocumentados, foram deixados de fora do processo de tomada de decisão sobre sua própria segurança em todos os níveis.

Além disso, reportagens investigativas do Los Angeles Times e do Capital & Main mostram grandes reduções na aplicação das leis de proteção contra o calor para trabalhadores ao ar livre na Califórnia, especialmente trabalhadores rurais. Condições extremas de calor muitas vezes acompanham os riscos de incêndio, levando em alguns casos a impactos duplos sobre os trabalhadores.

Essas reportagens destacam a queda na frequência de inspeções de locais de trabalho nos últimos anos pelo California Division of Occupational Safety and Health (Cal/OSHA), provavelmente causada por problemas de pessoal.

Aproveitando-se da supervisão reduzida, empregadores violam os direitos dos trabalhadores, negando pausas obrigatórias para sombra e água, e não fornecendo planos de prevenção contra doenças causadas pelo calor e respiradores. Para combater essas tendências preocupantes, o senador da Califórnia, Dave Cortese, e o membro da Assembleia, Robert Rivas, redigiram o Projeto de Lei 1299 do Senado, que estabeleceria a compensação dos trabalhadores em casos de doenças relacionadas ao calor.

O projeto de lei estabelece que, se um trabalhador sofrer uma lesão relacionada ao calor enquanto trabalha ao ar livre, presume-se que se trata de uma lesão ocupacional e o ônus de provar o contrário recai sobre o empregador. Atualmente, o projeto foi aprovado em ambas as casas da legislatura da Califórnia e aguarda a assinatura do governador Gavin Newsom para se tornar lei.

Prevenção de Incêndios Florestais na Cédula

A Proposição 4 da Cédula da Califórnia, oficialmente conhecida como Safe Drinking Water, Wildfire Prevention, Drought Preparedness, and Clean Air Bond Act of 2024, permitiria que o estado emitisse um título de 10 bilhões de dólares para financiar projetos e programas que abordem os impactos das mudanças climáticas. Desses fundos, 1,5 bilhão de dólares seriam destinados à gestão da saúde florestal e à prevenção de incêndios florestais. Se aprovada, a medida disponibilizaria grandes recursos para agências estaduais e locais financiarem projetos que reduzam o risco de incêndios florestais, aumentem a resposta e a resiliência das comunidades e restaurem florestas e paisagens.

O texto da proposição cita o aumento alarmante na frequência e intensidade dos incêndios florestais, bem como outros efeitos das mudanças climáticas, como calor extremo e seca.

Uma ampla coalizão de grupos e associações apoia o projeto, incluindo Clean Water Action, National Wildlife Federation, The Nature Conservancy, California Labor Federation, bombeiros da Califórnia e Environmental Defense Fund. Os apoiadores citam a urgência de enfrentar os impactos das mudanças climáticas e a necessidade de destinar recursos estaduais para combater esses desafios diretamente.

Ellen von zur Muehlen é estudante de pós-graduação na UCLA e membro do UAW.

Texto traduzido do People’s World por Luciana Cristina Ruy

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