Desgaste profissional relacionado ao estresse psicológico, ansiedade e esgotamento mental foi relato por 80% dos técnicos de enfermagem, agentes de saúde da família, maqueiros, condutores de ambulância, pessoal da limpeza, da cozinha, da manutenção e sepultadores a pesquisadores da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz).
De acordo com a pesquisa “Os trabalhadores invisíveis da Saúde: condições de trabalho e saúde mental no contexto da Covid-19 no Brasil”, a pandemia do novo coronavírus aprofundou as desigualdades, a exploração e o preconceito que recaem sobre o contingente formado por mais de 2 milhões de trabalhadores e trabalhadoras, de nível técnico e auxiliar, que exercem atividades de apoio na assistência, no cuidado e no enfrentamento à Covid-19.
Os resultados do estudo inédito foram apresentados em uma live na noite da última quinta (23) às duas maiores confederações representativas dos trabalhadores da saúde pública e privada, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS-CUT) e Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS).
Confira dados da pesquisa
Foram ouvidos 21.480 trabalhadores e trabalhadoras das redes de saúde pública, privada e filantrópica, de 2.395 municípios de todas as regiões do país. Do total:
- 72,5% dos técnicos e auxiliares da saúde são mulheres;
- 59% são pretos ou pardos;
- 32,9% deles têm até 35 anos;
- 50,3% têm até 50 anos;
- 70% dos participantes do estudo citaram a falta de apoio institucional;
- 35,5% admitiram ter sofrido violência ou discriminação durante a pandemia. A maioria das agressões (36,2%) ocorreu no ambiente de trabalho, na vizinhança (32,4%) e no trajeto casa-trabalho-casa (31,5%);
- 23,9% dos profissionais já apresentam comorbidades como: hipertensão (32%); obesidade (15%); doenças pulmonares (13%); depressão (12%), e diabetes (10%);
- 85,5% disseram que, na pandemia, a jornada de trabalho chegou a até 60 horas semanais;
- 53%não se sentem protegidos contra a Covid-19 no trabalho;
- 23,1% têm medo de se contaminar;
- 22,4% citaram falta, escassez e inadequação do uso de EPIs;
- 12,7% falaram sobre a ausência de estruturas necessárias para efetuar o trabalho como um dos principais motivos de desproteção;
- 25,6% precisam fazer bicos para sobreviver porque ganham entre um e dois salários-mínimos.
De acordo com a socióloga Maria Helena Machado, pesquisadora da Fiocruz e coordenadora da pesquisa, em entrevista à Folha de S. Paulo, esses trabalhadores vivem em situação de penúria, de sofrimento.
Dormem mal, comem mal. Falta salário, infraestrutura, condições mínimas de trabalho. Atuam em ambientes insalubres, muitos não têm acesso a EPIs [Equipamentos de Proteção Individual] recomendados ou, quando têm, são de baixa qualidade ou usados fora dos protocolos. Alguns afirmaram que já tiveram que comprar álcool, máscara, com recursos próprios. Outros nunca tinham usado uma máscara N95. – Maria Helena Machado
Muitos não têm vínculos com as instituições de saúde que garantam direitos trabalhistas. “São considerados autônomos, mas não têm o lastro social dos médicos, dos enfermeiros, que os permitam trabalhar em um ou dois lugares da área da saúde”, complementou a socióloga.
Benedito Augusto, presidente da CNTSS, disse á reportagem da Folha que a pesquisa chama a atenção para o recorte raça e gênero dos trabalhadores. “Temos a senzala da saúde [com mulheres pretas sendo a maioria desse contingente]. Essa pesquisa mostra a cara e a alma das condições de trabalho da saúde no país.”
Para Valdirlei Castagna, presidente da CNTS, os gestores de saúde, os parlamentares e o setor empresarial precisam proteger os profissionais mais vulneráveis e olhar com mais sensibilidade para as reivindicações históricas da categoria.
Ele afirmou à Folha que a pesquisa apontou práticas, como a hierarquização no uso de EPIs, que são inconcebíveis. “Algumas categorias usam EPIs melhores que as outras. Não dá para ser dessa forma. É um direito de todos independentemente da função.”
Fonte: Redação CUT